Igreja Virtual Evangélica

Carta aberta ao Pastor Evangélico Brasileiro

Ricardo Gondim é pastor da Assembléia de Deus Betesda, em São Paulo, e presidente do Instituto Cristão de Estudos Contemporâneos.
Versão Reduzida. A Versão Completa você encontra aqui.

Há muito queria escrever-lhe. Confesso que me sentia intimidado por temer que você - vou chamá-lo de você - não entendesse minha motivação ao redigir esta carta. Escrevo por amor e com um grande cuidado por sua vida e seu futuro.

Sei que é perturbador ser rotulado como oportunista. O grande público mal sabe que a grande maioria dos pastores ganha salários baixos e, como todos os brasileiros, sobrevive heroicamente numa economia perversa. Às vezes, gostaria de sair em sua defesa. Mostrar que o segmento evangélico mais rico e visível na televisão faz muito alarde, mas não representa o pulsar da igreja como um todo. Embora muitos não acreditem, é preciso deixar claro que ainda há pastores que não fazem conchavos políticos ordinários. Seus ministérios não estão à venda. Para a enorme maioria de homens e mulheres como você, a causa de Cristo é mais preciosa que projetos pessoais. Entretanto, não sairei publicamente para defender-lhe. Jesus Cristo afirmou que a sabedoria é justificada por todos os seus filhos (Lc 7:35). Sua vida basta como testemunho. Continue nesta estrada menos trilhada, e a mais difícil.

Recordo-me daquela experiência que você nos relatou publicamente. Você estava em um megaevento evangélico. Inquieto com o esforço de outros pastores para se sentarem nos primeiros lugares; percebendo que a maior parte do culto fora dedicado à promoção de cantores evangélicos; sabendo que grande parte do auditório sairia dali sem qualquer mudança de vida; revoltado por reconhecer que as estruturas sociais perversas deste país permaneceriam intocadas, você orou: "Deus, quero andar ao lado de gente que te leva a sério". Ele sempre responde preces como essa. Continue caminhando ao lado de líderes que não negociam a ética pelo sucesso, não trocam conteúdos por jargões, não tentam imitar as ações sobrenaturais do Espírito.

Quando olho para as tumbas dos grandes homens, qualquer resquício de sentimento de inveja morre dentro de mim. Quando leio os epitáfios dos magníficos, todos os desejos desordenados desaparecem. Quando me deparo com o sofrimento dos pais em um túmulo, meu coração se desmancha de compaixão. Quando vejo a tumba dos próprios pais, lembro do quanto é vão chorarmos por aqueles a quem logo seguiremos. Quando vejo reis colocados ao lado daqueles que os depuseram, quando medito sobre os espíritos antagônicos enterrados lado a lado, ou os homens sagrados que dividiram o mundo com suas discussões e contendas, medito cheio de dor e surpresa, sobre a pequenez das disputas, facções e debates da humanidade. Quando leio as variadas datas dos túmulos, algumas recentes, outras de seiscentos anos atrás, penso no grande Dia, no qual seremos todos contemporâneos, e faremos nossa aparição conjunta.

Não se afadigue para ser bem-sucedido. Deus não busca desempenho, apenas fidelidade. Ele jamais irá compará-lo a alguém. Seja tão-somente fiel ao que lhe foi confiado. Deus não está preocupado com o quanto temos, mas sim com o que fazemos com o que temos.

Gosto de vê-lo humano. Recordo-me com pormenores todas as vezes que você, sem temor, deixou-nos conhecer suas fraquezas. Ajudou-me a perceber que não luto sozinho contra a carne, o mundo e o diabo. Senti-me fortalecido em saber que somos parceiros de caminhada.

Quero, por último, agradecer por seus sermões. Ouço o rádio e assisto televisão com regularidade. Sei que não devo, mas faço minhas comparações. Acredito que há uma crise muito grande nos púlpitos evangélicos. Poucos se atrevem a pregar expositivamente as Escrituras. Na proliferação dos sermões tópicos percebe-se a falta de zelo. Reparei, ultimamente, que a maioria dos sermões rodopia no que Deus pode fazer pelas pessoas. Parece que muitos pastores perderam a noção da grandeza e majestade de Deus. Apresentam-no como mero cumpridor dos caprichos humanos. Muito obrigado pelo seu esmero em nos dar todo o conselho de Deus. Suas pregações podem destoar. Mas, continue exaltando a Cristo. Ele atrairá as pessoas a si mesmo. Não caia na tentação de adocicar sua mensagem, tornando o evangelho apenas uma versão simplória da neurolingüística. A mensagem da cruz pode estar fora de moda, mas ainda é o poder de Deus para salvar todo o que crê.

Você tem honrado o conselho que Paulo deu a Timóteo: "Prega a palavra, insta, quer seja oportuno, quer não, corrige, repreende, exorta com toda a longanimidade e doutrina. Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina. Pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas. Tu, porém, sê sóbrio em todas as coisas, suporta as aflições, faze o trabalho de um evangelista, cumpre cabalmente o teu ministério." (2 Tm 4.2-5.)

Daqui a cem anos escreverão a história de nossa geração. Nossa comunidade não alcançou a notoriedade de algumas igrejas mais famosas. Mas a vontade de Deus é que demos fruto e que nosso fruto permaneça. Não se preocupe. Caminhe de tal forma que você possa dizer no final de sua jornada: "Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé" (2 Tm 4:7). A história dirá o resto.

Conte comigo sempre,

Uma ovelha de seu rebanho,